domingo, 22 de abril de 2012


[heleno]

Heleno  
Heleno, 2012
José Henrique Fonseca


Talvez pelo fato de raramente o futebol render grandes filmes, José Henrique Fonseca foi buscar no boxe, o mais bem-sucedido cinematograficamente dos esportes, inspiração para filmar a vida de Heleno de Freitas, ídolo do Botafogo na década de 1940: Heleno tem Touro Indomável, a obra máxima de Martin Scorsese, a todo tempo no horizonte. Ou, ao menos, é essa a impressão que fica (mesmo que a referência à biografia de Jake LaMotta não tenha sido proposital) diante da história de um atleta vencedor em seu métier, mas derrotado por seu temperamento explosivo e incapacidade de lidar com o sucesso - e, ainda por cima, filmada em um belíssimo preto e branco.
O grande acerto de Heleno é a coragem de, num país apaixonado por futebol, deixar o esporte em segundo plano, diante da intensa vida de seu protagonista. A trajetória de Heleno, apresentada de maneira fragmentada e sem nenhum grande exagero na dramaturgia, é comovente. É claro que Fonseca não é Scorsese e Rodrigo Santoro não é Robert De Niro. Mas a atuação explosiva deste, hipnótico em cena, e a direção elegante daquele, tornam a comparação com Touro Indomável não uma depreciação a um filme menor pretensioso, mas um elogio gigantesco a uma obra surpreendente em sua qualidade.

terça-feira, 17 de abril de 2012


[um método perigoso]

Um Método Perigoso 
A Dangerous Method, 2011
David Cronenberg


Um Método Perigoso não deixa de ser uma pequena decepção. Ter, num filme de David Cronenberg, Freud e Jung lidando com repressão sexual é um sonho de consumo para qualquer fã do cineasta, afinal, trata-se do sujeito que filmou, entre outras coisas, Crash - Estranhos Prazeres. E vem justamente dessa expectativa a frustração.
Apesar de conseguir manter-se mais intimista, evitando o tom épico costumeiramente presente em cinebiografias de época (algo que o filme, no fim das contas, não pretende ser), Cronenberg e o roteirista Christopher Hampton fazem de Um Método Perigoso uma narrativa episódica, desprovida de grandes momentos. Se pensarmos, por exemplo, nos dois trabalhos imediatamente anteriores do diretor, Marcas da Violência e Senhores do Crime, fica claro que aqui se tem um filme menor. Há alguns acertos nos enquadramentos (nas sessões de psicanálise ou nas conversas entre Freud e Jung, por exemplo) que saltam aos olhos e as interpretações de Michael Fassbender e Viggo Mortensen são ótimas (até Keira Knightley me agradou, apesar do exagero de suas primeiras aparições).  No entanto, Um Método Perigoso padece de um mal maior que não se costuma ver nos filmes de Cronenberg: ao falar de repressão, o diretor parece se auto-reprimir, optando por um registro estranhamente comportado.


[shame]

Shame 
Shame, 2011
Steve McQueen


Shame está longe de ser a história de Michael Fassbender levando um punhado de nova-iorquinas para a cama. Por mais que ele, de fato, faça isso, na verdade o diretor Steve McQueen não tem nenhum interesse em imprimir sensualidade à sua narrativa: tem-se aqui um filme muito, muito triste, sobre um homem esmagado por sua solidão - interpretado por um ator magnífico. Nesse sentido, as cenas de sexo filmadas por McQueen me parecem um termômetro perfeito para definir Shame: todas elas nos mostram um personagem agindo de forma mecânica, simplesmente um viciado na plena satisfação de seu vício. A exceção está naquela que envolve o protagonista e uma colega de trabalho por quem este ousa se interessar efetivamente - e a forma como essa sequência termina fala muito sobre o que é o personagem de Fassbender.
No entanto, curiosamente, o momento mais marcante do filme tem pouco (ou nada) a ver com a condição de sex addicted de seu protagonista: em um bar, Carey Mulligan canta "New York, New York" numa melodia carregada de melancolia, enquanto Fassbender, constrangido, tenta conter toda a tristeza que sente, até deixar escapar uma furtiva lágrima. Ali, Shame se mostra, para além de toda a trajetória de dor de um homem viciado em sexo, como uma simples história sobre duas pessoas engolidas pela vida de forma impiedosa. É de cortar o coração.