Ben Affleck é um cara esperto. Quando ninguém mais parecia levá-lo a sério, por ter investido numa carreira de ator recheada de papéis ruins em obras de gosto no mínimo duvidoso (ele trabalhou duas vezes com Michael Bay, por exemplo), o melhor amigo de Matt Damon resolveu se transformar em diretor de cinema, apostando em filmes pequenos, de temática urbana e pegada policial: o ótimo Medo da Verdade e o excepcional Atração Perigosa, ambos ambientados em sua Boston natal. De onde poucos esperavam surgiu um cineasta promissor, com pleno domínio de seu ofício e um inusitado talento para arrancar grandes desempenhos de seus atores.
Argo, terceiro longa-metragem do Affleck diretor, é a confirmação de seu êxito nessa nova função. Saindo pela primeira vez de sua zona de conforto geográfica, ele constrói um thriller político exemplar: carrega na atmosfera tensa que cerca a missão de seu protagonista, deixando sempre viva no espectador a noção exata do risco que aqueles personagens correm e leva muito a sério a pesquisa e a reconstituição histórica do contexto retratado, sem deixar, todavia, de introduzir passagens claramente ficcionais (ou que exageram o que realmente aconteceu) com o propósito de aumentar o nervosismo em torno do que é mostrado na tela (caso das duas sequências mais tensas de Argo, a visita ao mercado popular de Teerã e o epílogo no aeroporto). E a opção de Affleck e do roteirista Chris Terrio pela ficção quase escrachada nesses momentos (principalmente no segundo deles) passa longe de incomodar, afinal, não é também do poder da mentira em Hollywood que o filme está falando?
Apesar de não ter a força dramática visceral de Atração Perigosa (ainda seu melhor filme), até pela necessidade de apostar num alívio cômico que, apesar de funcionar por si só ("Argo fuck yourself" é provavelmente a fala mais memorável do cinema em 2012) parece um tanto deslocado do clima sério da narrativa, Argo é o terceiro grande trabalho consecutivo de Ben Affleck na direção. Poucos cineastas em início de carreira conseguiram se manter tão regulares.