quarta-feira, 7 de março de 2018

12 Heróis


A posição norte-americana de vítima aos olhos do mundo após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 em pouco tempo foi suplantada pela antipatia decorrente da injustificada invasão do Iraque por tropas do país. Isso refletiu diretamente no cinema produzido ao longo da década de 2000 a respeito da chamada guerra contra o terror: ao menos até Guerra ao Terror (2008), de Kathryn Bigelow, predominaram filmes claramente engajados num esforço crítico às motivações do governo Bush para a empreitada militar no Oriente Médio. São bons exemplos disso o emblemático documentário Fahrenheit 11 de Setembro, de Michael Moore, o semidocumental Caminho Para Guantánamo, de Michael Winterbottom, e os ficcionais No Vale das Sombras, de Paul Haggis, Leões e Cordeiros, de Robert Redford, e Guerra Sem Cortes, de Brian De Palma.

A partir da entrada de Bigelow no tema, no entanto, passou a ser comum a presença quase anual nos cinemas de ao menos um filme que, ambientando nesse contexto, valoriza a bravura dos soldados norte-americanos ou ao menos coloca a experiência desses homens e mulheres na guerra acima de subtextos políticos. Há aqui obras-primas complexas, que conseguem imprimir grande densidade a seus protagonistas, como o duo de Bigelow Guerra ao Terror e A Hora Mais Escura e Sniper Americano, de Clint Eastwood, mas há também empreendimentos mais simplistas, puros exercícios de exaltação da camaradagem militar e dos valores norte-americanos diante do barbarismo inimigo – são os casos de O Grande Herói, de Peter Berg, 13 Horas, de Michael Bay, e, até certo ponto, desse 12 Heróis.

Dirigido pelo semidesconhecido Nicolai Fuglsig, o filme, que conta a história do primeiro grupo de soldados dos Estados Unidos a lutar no Afeganistão após o 11 de setembro, até tem algumas escolhas e possibilidades interessantes. Longe de mirar no ufanismo puro, Fuglsig se interessa pela construção de uma relação entre esses soldados e as milícias afegãs responsáveis por apoiá-los na luta contra o Talibã, mais especificamente entre seus respectivos líderes: o capitão Mitch Nelson (Chris Hemsworth) e o general nativo Dostum (Navid Negahban), figura a princípio dúbia, mas dotada de uma nobreza decorrente de anos de combate contra diferentes inimigos, algo que seu congênere norte-americano ainda não possui. Além disso, a localização da ação nas áridas montanhas do Afeganistão e o uso de cavalos pelos heróis no campo de batalha parecem prometer um diálogo de 12 Heróis com o western, algo já feito, por outros meios, em Sniper Americano. Mas a promessa não se cumpre realmente.

No fim das contas, interessa ao diretor fazer um filme de guerra genérico, com cenas de batalha que se pretendem grandiosas, mas que ele não consegue sequer tornar visualmente discerníveis. A geografia dessa ação, a maneira como seus participantes se organizam no espaço, é tratada com desleixo por Fuglsig. Mas o que mais incomoda é a incapacidade, sua e dos roteiristas Ted Tally (vencedor do Oscar nessa categoria por O Silêncio dos Inocentes!) e Peter Craig, de dar densidade aos personagens. Aqui vale lembrar novamente o filme de Eastwood sobre o tema: num determinado momento de Sniper Americano, seu protagonista, Chris Kyle (Bradley Cooper), é abordado nos Estados Unidos por um ex-soldado amputado que ele salvou da morte no Iraque e que o agradece emocionado; mesmo com o reconhecimento do heroísmo de Kyle, não há qualquer triunfalismo na conversa entre os dois, dada a dor que os move após a experiência da guerra. 12 Heróis, que pretende tratar da camaradagem que nasce dessa experiência, não consegue torná-la pesada de fato. Não há espaço para o trauma no filme. A volta para casa, encerrada a missão, é simplesmente gloriosa e a perpetuação da amizade de Nelson e Dostum é celebrada num letreiro que anuncia o final feliz da história. A luta no Afeganistão serviu, no fim das contas, como mero rito de passagem para o protagonista, até então um capitão sem qualquer experiência em combates reais.


12 Heróis 
12 Strong, 2018
Nicolai Fuglsig