A posição norte-americana de
vítima aos olhos do mundo após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001
em pouco tempo foi suplantada pela antipatia decorrente da injustificada
invasão do Iraque por tropas do país. Isso refletiu diretamente no cinema produzido
ao longo da década de 2000 a respeito da chamada guerra contra o terror: ao menos até Guerra ao Terror (2008), de Kathryn Bigelow, predominaram filmes
claramente engajados num esforço crítico às motivações do governo Bush para a
empreitada militar no Oriente Médio. São bons exemplos disso o emblemático
documentário Fahrenheit 11 de Setembro,
de Michael Moore, o semidocumental Caminho
Para Guantánamo, de Michael Winterbottom, e os ficcionais No Vale das Sombras, de Paul Haggis, Leões e Cordeiros, de Robert Redford, e Guerra Sem Cortes, de Brian De Palma.
A partir da entrada de Bigelow no
tema, no entanto, passou a ser comum a presença quase anual nos cinemas de ao
menos um filme que, ambientando nesse contexto, valoriza a bravura dos soldados
norte-americanos ou ao menos coloca a experiência desses homens e mulheres na
guerra acima de subtextos políticos. Há aqui obras-primas complexas, que
conseguem imprimir grande densidade a seus protagonistas, como o duo de Bigelow
Guerra ao Terror e A Hora Mais Escura e Sniper Americano, de Clint Eastwood, mas
há também empreendimentos mais simplistas, puros exercícios de exaltação da
camaradagem militar e dos valores norte-americanos diante do barbarismo inimigo – são os casos de O Grande Herói, de Peter Berg, 13 Horas, de Michael Bay, e, até certo
ponto, desse 12 Heróis.
Dirigido pelo semidesconhecido
Nicolai Fuglsig, o filme, que conta a história do primeiro grupo de soldados
dos Estados Unidos a lutar no Afeganistão após o 11 de setembro, até tem
algumas escolhas e possibilidades interessantes. Longe de mirar no ufanismo
puro, Fuglsig se interessa pela construção de uma relação entre esses soldados
e as milícias afegãs responsáveis por apoiá-los na luta contra o Talibã, mais
especificamente entre seus respectivos líderes: o capitão Mitch Nelson (Chris
Hemsworth) e o general nativo Dostum (Navid Negahban), figura a princípio
dúbia, mas dotada de uma nobreza decorrente de anos de combate contra
diferentes inimigos, algo que seu congênere norte-americano ainda não possui. Além
disso, a localização da ação nas áridas montanhas do Afeganistão e o uso de
cavalos pelos heróis no campo de batalha parecem prometer um diálogo de 12 Heróis com o western, algo já feito, por outros meios, em Sniper Americano. Mas a promessa não se cumpre realmente.
No fim das contas, interessa ao diretor fazer um
filme de guerra genérico, com cenas de batalha que se pretendem grandiosas, mas
que ele não consegue sequer tornar visualmente discerníveis. A geografia dessa
ação, a maneira como seus participantes se organizam no espaço, é tratada com
desleixo por Fuglsig. Mas o que mais incomoda é a incapacidade, sua e dos
roteiristas Ted Tally (vencedor do Oscar nessa categoria por O Silêncio dos Inocentes!) e Peter
Craig, de dar densidade aos personagens. Aqui vale lembrar novamente o filme de
Eastwood sobre o tema: num determinado momento de Sniper Americano, seu protagonista, Chris Kyle (Bradley Cooper), é
abordado nos Estados Unidos por um ex-soldado amputado que ele salvou da morte
no Iraque e que o agradece emocionado; mesmo com o reconhecimento do heroísmo
de Kyle, não há qualquer triunfalismo na conversa entre os dois, dada a dor que
os move após a experiência da guerra. 12
Heróis, que pretende tratar da camaradagem que nasce dessa experiência, não
consegue torná-la pesada de fato. Não há espaço para o trauma no filme. A volta
para casa, encerrada a missão, é simplesmente gloriosa e a perpetuação da
amizade de Nelson e Dostum é celebrada num letreiro que anuncia o final feliz
da história. A luta no Afeganistão serviu, no fim das contas, como mero rito de
passagem para o protagonista, até então um capitão sem qualquer experiência em
combates reais.
12 Strong, 2018
Nicolai Fuglsig